18 de abril de 2023
“Todo ponto de vista é a vista de um ponto. Para entender como alguém lê, é necessário saber como são seus olhos e qual é a sua visão do mundo.” Leonardo Boff
Vivemos em um mundo vibrante, dinâmico, repleto de cores, ruídos, aromas, texturas e experimentamos uma infinidade de estímulos sensoriais. Observamos as coisas tridimensionalmente (altura, largura e profundidade). Percebemos também a continuidade dos movimentos ao longo do tempo. Eis a grande diferença entre a fotografia e este mundo o qual nossos olhos o enxerga: a câmera fotográfica converte isto tudo em imagens bidimensionais e estáticas. Afinal de contas, uma foto não foge do papel ou da tela de nosso computador. =) Assim, dentre os cinco sentidos que possuímos, a fotografia se expressa apenas pela visão.
Este tópico, portanto, se destina a mostrar alguns recursos que nós fotógrafos lançamos mão para criar justamente este dinamismo que naturalmente falta à uma imagem capturada. Mesmo que tecnicamente em duas dimensões, conotativamente fotografias podem nos saltar aos olhos, seja por nos passarem sensações das mais variadas, como alegria, paz, calma, inquietação, medo, comoção… E mais especificamente para nosso tema atual, profundidade de campo.
Bem, vamos tentar enxergar pelo lado positivo estas limitações da fotografia: cabe ao fotógrafo, a arte de revelar nuances e extrair as sensações que pretende, através de seu olhar. O que fazemos é interpretar com nosso particular ponto de vista o mundo que nos cerca. Traduzimos através de imagens nosso modo de ver e sentir as coisas. Por exemplo, se reunirmos um grupo, colocarmos uma câmera na mão de cada indivíduo e os pedirmos para fotografar livremente determinada cena, provavelmente teremos resultados muito diversos, quanto maiores quanto mais heterogêneo for este grupo. Isto porque cada um tem suas histórias pessoais, suas experiências e maneiras de ver. Resumindo: cada um tem seu próprio olhar.
Finda esta necessária introdução, agora vamos diretos ao ponto: como podemos trabalhar nossas composições fotográficas para criarmos profundidade de campo? Nos tópicos a seguir, detalhemos algumas maneiras.
Esta é uma técnica que emprega ilusão de ótica para fazer com que um objeto pareça estar mais perto, mais longe, ser maior ou menor que realmente é. Lida com a nossa percepção visual através do uso de escalas e correlação entre os objetos e o ângulo de observador da câmera. Um clássico exemplo: aquelas fotos no Salar de Uyuni, que mais parecem montagens, mas não são, pois os efeitos obtidos são fruto da ilusão criada pela perspectiva forçada.
Basicamente, quando inserimos um objeto maior, porém distante, justaposto com outro objeto bem menor, porém muito próximo, o objeto menor parece ser bem maior.
Sobretudo utilizando lentes ultra grande angulares, poderemos obter poderosos efeitos desta distorção de perspectiva, tema discutido na segunda parte deste tutorial. Esta é uma interessante ferramenta, que permite que o fotógrafo brinque com a percepção comum, criando imagens únicas, de forma completamente diferente da qual nossos olhos observam a realidade.
A fotografia abaixo é um bom exemplo. A ideia foi aumentar a sensação de quão forte é o escalador. Posicionando-me bem próximo de seu braço direito, e usando 17mm de grande angular, este efeito foi bem proeminente.
Nós percebemos objetos que estão mais próximos de nós como maiores, comparativamente aos de mesmo tamanho, mas que estão mais distantes. Isto pode ser usado para gerar profundidade de campo, pois nossa mente traduz esta perspectiva, identificando que um objeto está mais próximo que outro. Desta forma, uma flor no primeiro plano parecerá maior que as outras flores de mesmo tamanho, dentro de um campo florido. E quanto mais distantes estas flores vão ficando, menores as veremos, numa escala decrescente.
É aquele ponto onde os objetos, a medida que vão se distanciando, ficam muito pequenos para se ver, como nas paralelas convergentes. Exemplos clássicos são o curso de uma estrada, desde o primeiro plano até que esta suma no fim do horizonte, ou uma linha de trem. Como vimos no tópico anterior, estas perspectivas criam uma forte noção de profundidade de campo na fotografia, por se tratar de um exemplo de escala decrescente.
E porque isto funciona tanto, como figura de composição? Se estudarmos os princípios de Gestalt, veremos que o olho humano é naturalmente atraído a seguir uma linha até sua conclusão e se mantém viajando por este caminho mesmo após o término desta. Por isto os pontos de fuga são tão importantes e eficazes. Eles concentram num único ponto as direções de várias linhas. Inevitavelmente, nossos olhares são sugados pelo ponto do fuga, que funcionam analogamente a um buraco negro. Nada escapa desta forte gravidade. Por isto também, as já apresentadas linhas e curvas, como elementos para guiar uma observação, são tão poderosas na fotografia.
Se fotografarmos ao contra luz uma cadeia de montanhas do tipo “mar de morros” ao amanhecer ou ao por-do-sol, perceberemos facilmente que quanto mais longe estas formações rochosas vão ficando, mais opacos irão ficando os contrastes e as saturações e mais nebulosas irão se tornando estas montanhas. Isto ocorre porque a atmosfera vai ficando mais densa a medida que se distancia de nós. Nossa experiência visual nos traduz isto em profundidade de campo. Sabemos que as montanhas mais próximas são as de silhuetas mais marcadas e aos poucos, vão tornando-se mais esbranquiçadas.
Outro exemplo onde podemos criar profundidade e separação em perspectivas atmosféricas é fotografando sob nevoeiros. Estas cenas nos permitem criar tridimensionalidade nas imagens e também separar os elementos do primeiro plano e dos planos posteriores, suavizando os assuntos mais distantes sem sacrificar a nitidez.
Esta é uma técnica bem conhecida e utilizada, mesmo por amadores. Provavelmente todos vocês já a utilizaram. Molduras simplificam a composição, criando profundidade e focando a atenção em elementos importantes na cena. Alguns exemplos incluem árvores, arcos naturais e janelas.
Podem funcionar bem também quando há grande diferença de luz entre o assunto emoldurado e a moldura em si, como nos casos de contra luz, onde a moldura é a representada em forma de silhueta.
Por si só, a luz pode criar uma espécie de profundidade de campo em nossas fotografias, que chamamos volume. Este é o caso da luz lateral. Este é mais um dos motivos pelo qual todo fotógrafo, especialmente os de natureza, são completamente fanáticos pela luz do amanhecer e do entardecer, a famosa Golden Hour. Além de tantas qualidades desta luz, uma delas é que quando incide de forma inclinada, lateralmente ao assunto fotografado, as sombras geradas definem muito bem os contornos e geram volume à imagem. As composições ficam muito mais realistas e prazeirosas aos nossos olhos. Em um de meus posts anteriores, o tema luz natural é abordado. Clique aqui para acessar.
Também para retratos, a luz lateral, vinda por exemplo de uma janela, produz um efeito sensacional de volume e contorno das formas. Esta luz, por ser indireta, também é suavizada, com benefícios de modelagem e contrastes mais leves. Apesar de ter sido introduzida por grandes mestres da pintura Renascentista, nós, fotógrafos, tiramos muito proveito desta luz.
Pois bem, este capítulo do tutorial teve como principal objetivo exemplificar algumas maneiras de se obter, através da composição fotográfica, uma melhor e mais estética mensagem de profundidade de campo. Espero que tenham gostado! Comentem aqui o que vocês gostariam de ler neste blog, a respeito de fotografia de viagens e natureza!